DE REGRESSO... E EM “COMPARAÇÕES”

Passaram quatro meses desde que regressei a terras lusas. Para trás ficaram dois bonitos e marcantes anos de actividades junto dos nossos doentes de lepra.

É tempo de reiniciar a “vida” que tinha até ter partido em direcção a Nampula, Moçambique. Encontro tudo um pouco diferente do que deixei: as pessoas, o clima, os espaços, a forma de viver, … outras preocupações que aquelas que estava habituada a ouvir e viver nas terras quentes, coloridas e sofridas de África.

Também aqui encontro preocupações, problemas… pois as dificuldades do dia-a-dia estão presentes em todos os cantos do Planeta, embora sejam vividas de forma diferente.

Muitas vezes me lembro dos doentes de lepra e de algumas das suas preocupações, preocupações essas, por exemplo, quando esperam, pacientemente a chegada do enfermeiro e do servente da Sala de Consultas ou da Sala de Pensos, que teimam em atrasar-se e que encontram, algumas vezes, outras prioridades que não as de os atender. Preocupações em relação ao cultivo e rendimento das suas machambas, visto que dos campos de cultivo se retira a grande parte do seu sustento, se não todo! Preocupações relativas às suas condições de vida quando, por exemplo, a água escasseia e é preciso fazer fila no único furo ou poço de água da aldeia ou bairro para conseguir um galão (garrafão) ou dois diários para a família…

Aqui, as preocupações são outras pois também estamos numa realidade diferente: a maioria das casas tem água canalizada, poucos cultivam os campos e as reclamações podem começar quando o técnico de saúde se atrasa cinco minutos ou menos, por ter ido, simplesmente à casa de banho. Mas também é verdade que a cultura é outra. O estilo de vida é outro. A forma de ver a vida e de a viver é outra. Isto é importante a ter em conta!

Para mim que estive em Moçambique este tempo e agora estou de regresso, muitas vezes encontro-me a comparar a vida de lá e a de cá, numa tentativa desigual de equiparar algo que não pode ser equiparado, mas que deve ser partilhado com todos, para aprendizagem de alguns aspectos, hoje um pouco descurados por nós aqui.

Partilhar a experiência e a vivência que tive junto deste povo, para que outros possam continuar a colaborar no trabalho da APARF.

Partilhar as dificuldades em que vive aquele povo e a forma como as conseguem resolver, algumas vezes para meu espanto. 

Sensibilizar para certas atitudes que devemos adoptar e formas de ver a vida, os nossos irmãos, os problemas e as nossas preocupações, pois aquele Povo Makhua, da zona onde estive, é pobre, vive mal, sofre muito mas mesmo assim sorri e é feliz mesmo não possuindo bens. 

Muitas vezes temos tudo nas nossas mãos e não lhe damos o valor e a importância devida. Água canalizada, luz eléctrica, comida na mesa, estradas alcatroadas, sinalização, vestuário, … coisas que muita gente em Nampula não tem e não vai ter acesso tão cedo. É preciso saber dar valor a estes pequenos aspectos e usá-los bem, pensando que outros não os têm.

A minha aprendizagem com os “nossos queridos Makhuas” valeu-me desse sentido de partilha, de vivência em comunidade, de dar valor a coisas simples e de encontrar a felicidade e a satisfação em pequenos gestos como uma visita, uma carta, um telefonema, um agradecimento, uma palavra… um sorriso.

Vanda Barnabé 

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