Moçambique - Acção no Terreno II

CENTRO DE NUTRIÇÃO

O Centro Nutricional Maria Ana Mogas é um centro com uma estrutura física em bom estado e bastante satisfatória para as necessidades presentes. Equipada de 4 quartos com um total de 10 camas, uma cozinha com copa, uma casa de banho, uma latrina, uma lavandaria e um alpendre, distribuídos de forma harmoniosa. Não possui, contudo, e à semelhança das outras infraestruturas locais, água canalizada nem electricidade. 

Os principais beneficiários do Centro Nutricional são crianças com desnutrição moderada e/ou grave, filhos de mães com percepção de insuficiente produção de leite materno e crianças órfãs. O Centro Nutricional apoia, mensalmente, cerca de 30 crianças em regime ambulatório, e algumas crianças em regime de internamento, quando a sua situação é grave. 

Às crianças apoiadas em regime ambulatório é fornecida farinha multimistura composta pela moagem conjunta de milho, feijão, soja, amendoim, cascas de ovo, folhas secas de muringa/mandioca e sementes de abóbora/papaia, etc.. Ao longo dos meses senti a necessidade de fazer um pouco mais pela saúde destas famílias. Assim, como enfermeira, apliquei os conhecimentos que tinha e que fui adquirindo pelo estudo de literatura na área. Procurei, por um lado, optimizar a avaliação contínua do estado de nutrição de cada criança apoiada, e, por outro, dirigir-me às mães/cuidadoras das crianças desnutridas a fim de lhes dar os conhecimentos básicos sobre amamentação, nutrição, confecção de alimentos e necessidades nutricionais da criança.

As crianças que se encontram em estado grave são internadas no Centro para reabilitação nutricional. Geralmente vêm em situações muito graves, que o Centro de Saúde local não tem recursos humanos nem materiais (alimentação) para atender, e que os conhecimentos das senhoras que trabalham no centro nutricional nem sempre superam todas as necessidades apresentadas pelas crianças. Estas, devido ao seu estado nutricional, encontram-se demasiado frágeis para metabolizar certos tipos de nutrientes, necessitando de uma nutrição adequada para travar a destruição de tecidos resultante da carência constante de nutrientes essenciais. Assim, a cada criança que foi internada, procurei, a cada hora, avaliar o seu estado geral e actuar segundo este, tendo por base o documento da OMS: Manejo da desnutrição grave: Um manual para profissionais de saúde de nível superior. Muitas crianças desnutridas foram internadas e, felizmente, várias foram salvas. Contudo, a falta de recursos materiais de qualidade, a gravidade acentuada que apresentavam no momento de internamento, a fraca assistência a desnutridos que se observa na Unidade Sanitária de Mandimba (para onde deveriam ser encaminhados os casos graves) e a influência da medicina tradicional que condiciona o comportamento da família na tomada de decisão do tratamento a efectuar à criança, levou ao fracasso de tratamento de algumas crianças, apesar de toda a gestão nutricional e terapêutica.

Dos recursos humanos deste centro fazem parte duas senhoras que trabalham por turnos semanais e uma guarda noturna. Estas senhoras têm uma vasta experiência no tratamento de crianças desnutridas, contudo, nunca tiveram uma formação específica na área que lhes permitisse melhorarem o atendimento à criança e o aconselhamento às mães das crianças em risco. Por este motivo, organizei diversas formações com elas, nas quais foram abordados temas como “macro e micro nutrientes” e “avaliação do estado nutricional da criança”. Estas formações, para além de aumentarem os conhecimentos das formandas, tinham também como função ajudá-las a planear de forma autónoma sessões de educação para a saúde a serem realizadas com as mães das crianças beneficiárias do Centro Nutricional. 

Após a capacitação das senhoras do Centro Nutricional, realizaram-se algumas sessões de educação para a saúde às mães das crianças beneficiárias do Centro, abordando temas como preparação de multimistura e de sopas com demonstração e participação activa na confecção; importância da amamentação e alimentação saudável. Só através da capacitação das mães seria possível dar alta às crianças seguidas em ambulatório com a segurança de que existe um cuidador no domicílio com conhecimentos básicos de nutrição que lhe assegure todos os nutrientes necessários ao seu desenvolvimento.

Outro aspecto que procurei desenvolver ao longo dos meses foi a criação e preenchimento de processo individual da criança desnutrida, seguida tanto em regime ambulatório como no internamento, de forma a permitir um seguimento mais estruturado das crianças apoiadas. A implementação dos registos sistematizados requereu muita persistência e formação para demonstrar às senhoras do Centro, resistentes inicialmente a esta mudança, que a elaboração de registos era um elemento fundamental na avaliação da criança. Com o passar do tempo, as senhoras incluíram na sua rotina de assistência à criança desnutrida a sua avaliação e registo.

Tomei a iniciativa de, em colaboração com as senhoras que trabalham no centro nutricional e as mães das crianças internadas, abrir uma pequena horta com várias plantas (couves, cenouras, espinafres, abóboras, papaieiras e mangueiras), semeando algumas sementes, algumas portuguesas outras que fui recolhendo em Moçambique. Desta horta foi possível não só recolher produtos para as refeições das crianças internadas e acompanhantes, como também partilhar várias plantas para transplantação nas residências das mães de crianças seguidas em ambulatório. (...)

    Fátima Santos (Voluntária da APARF)

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